“Toca a trabalhar, toca a ensaiar!” é um texto em verso da autoria de Helena Maia sobre a história do Rancho Folclórico do Centro Beira Mondego de Santo Varão, apresentado durante a festa de celebração do XV aniversário deste grupo.
Deliciem-se com a su leitura!…

Toca a trabalhar, toca a ensaiar!
Teve este Grupo, um começo original.
A pedido do poder local e para a Freguesia brilhar
Nas comemorações do 25 de Abril,
Foi o Centro Beira Mondego, convidado a participar.
Juntaram-se uns amigos, e uma tarde de Etnografia e Folclore
Resolvem apresentar.
Toca a trabalhar, toca a ensaiar!

Abriram-se os baús, os antigos e bafientos enxovais,
E de lá saíram, camisas, saiotes, lenços, aventais,
Xailes, algibeiras chinelas e outros que tais!
Pediram-se emprestados:
Saias, corpetes, chapéus e coisas mais!…
Arrecadas, fios, brincos, e cordão,
Violas, ferrinhos, cavaquinhos e acordeão.
Toca a trabalhar, toca a ensaiar!

No Centro Beira Mondego, ensaiados pela Fátima Verão,
Coordenados pela Maria João;
Apresentámo-nos na SAPEC.
Ceifeiros, mondadeiras, tricanas, romeiros e fatos de domingar.
Entre modas de roda, viras e fado,
Foi uma tarde de pasmar, um dia bem passado.
E foi tal a expectativa, tal a sensação,
Que fomos notícia de jornal
De uma brincadeira, no dia da Revolução.
Mas do querer, da vontade e do coração.
Sem dor e com muita alegria, Nasce a 19 de Outubro:
O Rancho Folclórico do Centro Beira Mondego de Santo Varão.
Toca a trabalhar, toca a ensaiar!

Quinze anos se passaram, desde então, o tempo voa,
Como dizia a minha avó, mulher do povo,
Neste grupo tão bem representada,
“Muita água tem corrido debaixo da ponte.”
São muitas as histórias e peripécias pra contar,
Umas tristes, outras alegres,
Não vou referir todas, uma ou outra vou recordar!
Com o passado se constrói o futuro.
Toca a trabalhar toca a ensaiar!

A cena dos tiros, que mais parece um filme
Viu-se esta gentinha envolvida, numa rixa familiar;
Em que o marido a mulher resolve matar,
E a tiros de caçadeira nela procura acertar;
Esgueirando-se entre os carros, a mulher foge;
E no meu carro se vai enfiar:
Pânico geral, aí Jesus quem me acode!…
“Não tenham medo, é chumbo miúdo, não faz mal”
Pááá… Páááá… ao segundo disparo,
Mais vale prevenir que remediar
Isto é que foi pra vinha voar!…
Parecia a 2ª guerra mundial.
Houve gritos, sapatos perdidos, saias e saiotes a esvoaçar.
Aí Minha Santa Mãezinha, ficou tudo muito nervoso,
Mas felizmente só um foi ao hospital, o nosso Zé Veloso.
Fomos manchete de jornal:
-“Rancho Folclórico do CBM de Santo Varão,
Foi apanhado no meio de tiroteio, quando ia para uma atuação
Freguesia da Anobra, lugar de São João”
Toca a trabalhar toca a ensaiar!

A nossa ida a Valença, outra memória, outra história,
Esta tenho que contar!…
Depois da visita à cidade, de percorrermos as muralhas,
E comprarmos pijamas e toalhas.
Fomos almoçar assim como os demais,
Recomendados por alguém da organização,
Junto a uma Churrasqueira,
Que pertencia ao presidente do grupo,
Enquanto esperava-mos pela refeição,
No 1º andar da casa, era uma animação!…
Telemóveis a tocar, carros a parar,
Meninas a subir, meninas a descer,
Umas loiras, outras morenas, bem apanhadas,
Mas muito destapadas, escada abaixo, escada acima,
Começou tudo a olhar para o 1ºandar, e a prestar atenção,
Aquele movimento, àquela animação;
O que é isto afinal? Nunca se viu tal!
Baixinho murmurava-se, “é uma casa de meninas”.
Diz o Maia com a descrição que lhe é habitual:
”Ó Nando, isto é uma churrasqueira mas só vende frangas pra fora”
Foi risada geral!…
Toca a trabalhar, toca a ensaiar!

Um grupo de malucos, mais malucos que os demais
Resolve que isto de dançar e cantar
Não é uma brincadeira, vamos levar isto a sério,
Para melhor representar a nossa Região,
Vão ter com a Federação, para nos aconselhar!
Para nos verem cantar e dançar, dar a sua opinião!
Dizem os senhores conselheiros:
-Tudo mal, quase tudo mal,
Saia pra baixo, camisa com botão, sem botão
Lenço atado assim, xaile atado assado, peitilhos pra baixo,
Saias apertadas com cinta, sem cinta com cordão sim não,
Mais um saiote, mais um capote.
Braços levantados, pé no ar pé no chão,
Roda que roda, vira que vira,
Tum! Tum! Não.
Toca a trabalhar! Toca a ensaiar!

Toca a vestir e calçar, e o dinheirinho a gastar!
Foram dois anos de labuta sem nunca desistir
Ouvindo aqui, escutando acolá, nem sempre bom!
Mas num dia de festa como o de hoje, veio a decisão.
Pela mão do Sr. Presidente, Fernando Ferreira,
Recebemos o diploma de Sócio Efetivo da Federação
Como prémio por tanto esforço e tanta dedicação,
Fomos a Itália, Pietracattella, a Viveiro na Galiza,
Este ano à Terceira, lá fomos de avião,
No festival do COFIT participar,
Fomos parar á Internet,
Demos entrevistas para a rádio, jornais e até prá televisão.
Toca a trabalhar! Toca a ensaiar!

De norte a sul do pais,
Em feiras, festivais e romarias
Mostramos o que de melhor temos.
E nos foi ensinado por avós e tias.
O dançar, o trajar, representar e cantar.
O legado dos nossos antepassados,
De gente simples de trabalho,
Como os meus e os vossos avós
E podem querer nunca vos deixamos ficar mal,
A Região do Baixo Mondego,
Montemor-o-Velho, Santo Varão
E a sua cultura imaterial.
Quinze anos se passaram,
Muita coisa mudou desde então.
O passado serve para construir o futuro,
E hoje somos uma referência na preservação,
Dos usos e costumes da nossa região.
Estavam longe de imaginar,
Aqueles que participaram numa brincadeira,
No dia da Revolução.
Todos contribuíram para a história desta família,
Da qual a maior parte somos pais.
Já chorámos e rimos juntos,
Já perdemos amigos queridos, mas ganhámos muitos mais.
Venha o ouro a prata ou o bronze, nós já ganhámos!
Estamos juntos nesta história.
E isto ninguém nos pode tirar!
Nestes tempos de crise, reforcem-se os laços.
De partilha, tolerância e compreensão,
Estreitem-se os abraços.
Servir de exemplo aos nossos jovens.
Às vezes engolir alguns sapos,
Porque tudo faz parte da vida.
Do Rancho folclórico de Santo Varão.
Meus amigos não tenham duvidas
Para outros 15 anos comemorar
A receita:
Toca a trabalhar! Toca a ensaiar!

Lena Maia, 21 de Outubro de 2012